A Lei 13.467/2017 trouxe diversas mudanças à legislação trabalhista que ainda precisam de maior reflexão. Nesta semana, abordarei algumas alterações no instituto da prescrição e identificarei as três possibilidades de arguição pelos interessados nos diferentes momentos processuais: durante a fase de conhecimento, após o trânsito em julgado e antes do início da execução e, finalmente, após deflagrada a execução trabalhista. Daí o título aventando três prescrições trabalhistas.

A discussão em análise remonta à antiga celeuma da nossa área e que não chegou a ficar clara em nosso sistema: a prescrição da dívida prevista no artigo 884, §1º, da CLT como matéria de defesa nos embargos à execução. Parte da doutrina apontava tal prescrição como sendo a intercorrente (o que era majoritariamente rechaçado pela jurisprudência), parte a identificava como uma prescrição superveniente à formação do título, a ser utilizada apenas quando, na fase de liquidação ou execução, o juiz não pudesse atuar de ofício e, ainda, a parte que simplesmente não apresentava uma interpretação que pudesse justificar sua arguição pelo devedor trabalhista.

Com o advento da reforma trabalhista, creio que ficou bem mais fácil entender a sistemática de arguição da prescrição — e seus diferentes tipos — no Processo do Trabalho. A primeira, sob a qual não paira maiores dúvidas, é a prevista no artigo 7º, XXIX, da Constituição da República e repetida no artigo 11 da CLT em sua atual redação: “A pretensão quanto a créditos resultantes das relações de trabalho prescreve em cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho”.

Trata-se da prescrição a ser arguida pelo interessado na fase de conhecimento, tanto a bienal quanto a quinquenal, em que será verificado se o ajuizamento da ação ocorreu dentro do biênio após a extinção do contrato de trabalho e, depois, quais pretensões encontram-se dentro do prazo de cinco anos a contar retroativamente da mesma data do ajuizamento. Se não observado o prazo bienal, todas as pretensões de caráter condenatório estarão automaticamente fulminadas pela prescrição. Observado o prazo bienal, somente as pretensões anteriores ao marco quinquenal estão cobertas pelo manto prescricional.

Como já estava pacificado, a arguição desta prescrição somente pode ocorrer na fase de conhecimento, nas instâncias ordinárias (Súmula 153 do TST), entendendo-se ser incompatível com o Processo do Trabalho a pronúncia de ofício pelo juiz em razão da principiologia que rege este ramo do Direito, que foi construído sob a premissa de criação de regras para obter a paridade das armas, não sendo lógico que se atribua ao juiz uma conduta que aumente a distância entre os litigantes, o que afetaria o princípio da isonomia. Ademais, a própria reforma trabalhista reafirma tal conclusão, uma vez que o legislador foi expresso em fixar quando cabe a pronúncia de prescrição de ofício na área trabalhista, o que somente ocorreu com a prescrição intercorrente na fase de execução.

A segunda prescrição facilmente identificável na legislação é justamente a intercorrente. Positivada no artigo 11-A da CLT e seus parágrafos, deixou claro o legislador não apenas o seu prazo (dois anos), mas a sua incidência: “A fluência do prazo prescricional intercorrente inicia-se quando o exequente deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução”. Evidente, portanto, que somente pode se falar em prescrição intercorrente após iniciada a fase de execução, aqui cabendo sua aplicação de ofício ou a requerimento do interessado, como previsto no mesmo artigo consolidado, em seu segundo parágrafo (“A declaração da prescrição intercorrente pode ser requerida ou declarada de ofício em qualquer grau de jurisdição”).

E nesse ponto começa a parte mais interessante. A reforma trabalhista modificou substancialmente o procedimento quanto às fases de liquidação e execução no Processo do Trabalho, sendo possível perceber que há duas formas de se deflagrar a execução trabalhista: a requerimento da parte ou de ofício pelo juiz. Ocorre que a execução de ofício somente pode ocorrer, a partir da reforma, quando a parte não se encontra assistida por advogado, sendo a regra, portanto, a necessidade de iniciativa do interessado para se deflagrar a fase executiva.

Na prática, essa modificação traz uma consequência bastante interessante, que provocará efeitos na prescrição, pois atualmente é possível que haja a decisão judicial na fase de conhecimento transitada em julgado, a liquidação (quando necessário) e, simplesmente, o feito ficar paralisado por não haver requerimento do credor para início da execução trabalhista. Nesses casos, há de se indagar: existe prazo para o credor requerer a execução? Depois de décadas com o feito abandonado, poderia o título executivo judicial servir de base para uma execução trabalhista?

Penso que não. A esta altura, deve-se estar pensando que seria caso de aplicar a prescrição intercorrente. Entretanto, para quem observa os detalhes das modificações impostas pela reforma trabalhista, a alegação de prescrição intercorrente deveria ser rejeitada já que o legislador firmou seu cabimento apenas dentro da fase de execução e, claro, se a execução ainda não se iniciou, seria ilógica a sua utilização. Tampouco seria possível se arguir a prescrição da fase de conhecimento, por já esgotadas as instâncias ordinárias, estando preclusa a oportunidade.

A solução, portanto, encontra-se no antigo artigo 884, §1º, da CLT: prescrição da dívida. A própria circunstância de sua alegação em sede de embargos à execução reafirma a tese aqui defendida, pois não se trata da mesma prescrição da fase de conhecimento nem da prescrição intercorrente, que pode ser arguida a qualquer momento na execução, bastando que o credor tenha descumprido determinação judicial específica por sua inércia.

A prescrição da dívida pressupõe, assim, fato superveniente à fase de conhecimento e fato diverso do descumprimento de determinação judicial no curso da execução, o que permite concluir pela prescrição ocorrida após o término da fase de conhecimento e antes do início da execução.

Em outras palavras, a prescrição da dívida ocorre quando a sentença líquida transita em julgado e o interessado não requer a execução no prazo legal; ou não promove o interessado a liquidação de sentença; ou após a liquidação de sentença simplesmente o interessado não requer a execução. Isso tudo, claro, quando não for possível ao juiz atuar de ofício, pois, segundo entendimento jurisprudencial majoritário, sempre que o juiz puder praticar os atos de ofício, não há que se falar em inércia do titular do direito.

Entendendo-se que o procedimento trabalhista, quando a parte se encontra assistida por advogado, impede o juiz de promover a execução de ofício, conforme expressa determinação legal (artigo 878 da CLT), reforça-se a ideia de que a liquidação constitui uma fase prévia, mesmo que topicamente incluída no Capítulo V da CLT, que trata das normas de execução, e das duas uma: ou o juiz pode realizar a liquidação de ofício, por ainda não estarmos na execução (fase prévia), ou, por estar localizada na execução, igualmente sua realização dependeria de requerimento do interessado.

Entendo pela primeira alternativa, como fase prévia que pode ser realizada de ofício, como preparatória para a execução propriamente dita, esta, sim, a depender de requerimento do interessado em caso de estar presente a representação por advogado. Logo, o argumento de ser impossível, atualmente, o início da execução sem a prévia liquidação da sentença torna-se quase que insuperável. Parece que o intuito do legislador foi exatamente este: não executar sem antes haver a delimitação do valor devido, tema que já abordamos em coluna anterior.

Em resumo, adotando-se o entendimento acima exposto, teremos delimitadas as três diferentes possibilidade de alegação da prescrição no Processo do Trabalho quanto ao momento e quanto à iniciativa:

— Prescrição bienal e quinquenal: fase de conhecimento pelos interessados e durante as instâncias ordinárias;

— Prescrição da dívida: após fase de conhecimento e antes de iniciada a execução pelos interessados e, em regra, nos embargos à execução (sendo possível admitir a exceção de pré-executividade, matéria para debate futuro);

 Prescrição intercorrente: no curso da execução, pelos interessados ou de ofício pelo juiz.

 

 é juiz do Trabalho no TRT-RJ e mestre e Doutor em Direito pela PUC-SP.

Fonte: Revista Consultor Jurídico